Um dia, criança ainda, desenhei uma mulher nua saindo da chama de uma vela. Disseram que era erótico. Que era feio. Erótico? Eu ainda não sabia o que era aquilo. Para mim era apenas bonito. O desenho sumiu. Depois desenhei umas mulheres com capuz andando num lago sob um céu noturno, com mais de duas luas. Acharam o desenho “estranho”. Também sumiu. Mas eram apenas desenhos.
Descobri desde cedo que existem coisas que é melhor guardar e não revelar. Que nem tudo se conta para todo mundo e certas delicadezas são restritas a alguns eleitos. Com o tempo, vamos descobrindo, quase “intuindo” para quem podemos mostrar os “desenhos”. Certas delicadezas de mundos ainda em construção, jardins mais que secretos e projetos com cara de sonho devem ser guardados entre silêncios muito próprios. Sem fotos, por favor. Cuidado ao compartilhar.
Então, vieram os cadernos com pauta, sem pauta e de diversos tamanhos. Neles os desenhos e a escrita ganharam casa. Um dia desses, encontrei com eles em caixas de mudança. Aquelas coisas. Parei e li alguns. Eu me revisitei. Minhas traduções de mim ainda moram lá. Mas aprendi a escondê-los. De volta para caixa. Mais seguro. Hoje alguns segredos e algumas verdades andam à solta. Um despertar que não tem volta. Quando não dou pé, está tudo lá. Tudo lá e aqui também, com aquela densidade própria das lembranças e dos esquecimentos de que somos feitos.
Cadernos secretos são boias de salvamento quando as tempestades chegam. Coletes salva vidas, portos seguros. E tudo que eu disser a partir de agora sobre o prazer de escrever e desenhar poderá ser redundante.